domingo, 9 de agosto de 2015

Diretrizes Especificas Para A Interpretação da Escritura III: Analise Teológica E Aplicação Contemporânea




Os escritores bíblicos fornecem abundantes evidencias da necessidade de determinar a mensagem teológica de uma passagem como parte do empreendimento hermenêutico. Jesus revela, por exemplo, as implicações teológicas de longo alcance do decálogo no sermão do monte (Mt 5:17-28). O concilio de Jerusalém apresenta a ideia teologica importada de Amos 9:11 e 12, de que os gentios não precisavam se converter ao judaísmo para se tornar cristãos (Atos:15:13-21)

Métodos De Estudo Teológico

 

a.                      Abordagem livro por livro. Escritores inspirados como João pedem que seus leitores estudem o livro bíblico do começo ao fim (Ap 22:18,19). Cada escritor bíblico forneceu uma perspectiva única dentro da harmonia global da verdade bíblica. Em vista disso, é extremamente compensador lançar mão de um livro inteiro e captar seu tema teológico principal. Às vezes, a mensagem é um único e predominante tema, contendo diversos subtemas e motivo; outras vezes, há temas diversificados e paralelos. È útil fazer um esboço do livro, esquematizando o fluxo do pensamento seguido pelo escritor bíblico.
b.                      Exposição verso por verso. Os sermões de Pedro e Paulo (At 2;3;13) ilustram o método de exposição verso por verso de passagens bíblicas. O que se enfatiza nesse tipo de estudo são os princípios e as verdades teológicas básicas que emergem da passagem e que possuem aplicação pratica. É importante enfocar um único verso da Escritura por sua vez, até que a reflexão e o estudo diligente, realizados a guia do Espirito Santo, torne claro o significado.
c.                       Estudo tópico/temático. A abordagem temática é ilustrada com toda clareza na própria pregação de Jesus (Lc 24:25-27). Essa abordagem toma temas bíblicos explícitos e deixa que a Escritura seja sua própria interprete, reunindo e comparando todos os dados bíblicos sobre determinado tema. O uso de concordância e referencias cruzadas para rastrear palavras-chave e conceitos é extremamente importante. Exemplos de grandes temas bíblicos a serem investigados são o sábado, a segunda vinda, a morte e ressurreição, a salvação, o santuário, o arrependimento e o juízo. Mas também pode ser feita uma abordagem que traga problemas da vida moderna, alguma necessidade especifica atual e procurar aplicar tudo o que a bíblia fala sobre este tema, contudo se deve ter cuidado para não cometer erro e fazer falsa analogia, por isso, deve-se ter muito cuidado com o verdadeiro sentido de cada texto para o remeter.
d.                      Perspectiva do grandioso tema central. Os escritores do NT fazem suas analises teológicas de passagens especificas considerando o contexto mais amplo do multifacetado “Grandioso Tema Central” da escritura, conforme apresentado na abertura e no encerramento das páginas da bíblia (Gn 1-3; Ap 20-22). Isso inclui: a criação e o plano divino para este mundo, o caráter de Deus, o surgimento do conflito moral cósmico, o plano da redenção-restauração em Cristo e sua obra expiatória, o Juízo escatológico e o termino do pecado no clímax da história. O “grandioso tema central” se torna assim um referencial capaz de promover não só unidade e harmonia essencial, mas também significado fundamental aos diversos temas bíblicos.
e.                       Analise da estrutura literária. A estrutura literária de um livro se torna muitas vezes a chave para uma compreensão mais clara de sua mensagem teologica central de um livro. Em Levítico, o Dia da Expiação, descrito no capítulo 16, é o ápice da estrutura quiasmática. O dia mais sagrado do ano judaico, no qual a pessoa mais sagrada da Terra (o sumo sacerdote) entra no lugar mais sagrado da terra (lugar santíssimo) para realizar a tarefa mais sagrada de todo o ano – esse dia é reservado para o capitulo central da torah. O fato dele ter sido posto dentro de Levítico – acompanhado de um lado (Lv 1-15) pela menção constante de sangue e sacrifício, e do lado oposto (Lv 17-23), por repetidos apelos à santidade – fornece uma perspectiva teológica equilibrada do Dia da Expiação.

2 Passagens Teológicas Problemáticas

            Ao lidar com passagens teológicas aparentemente problemáticas, principalmente as que dizem respeito ao caráter de Deus, ou com supostas distorções da verdade, podem ser uteis as seguintes perguntas:

a.                       Qual a visão global do caráter de Deus na Escritura, especialmente conforme revelada no calvário? É preciso lembrar que o Pai e o Filho possuem o mesmo caráter (Jo 14:9) e que o Deus do AT é o mesmo do NT (Jo 8:58). Corretamente compreendidas no contexto abrangente do grande conflito, todas as passagens da Escritura apresentam um retrato coerente e uniforme do caráter de Deus (ver Grande conflito I – IV).
b.                      Existe na Escrita ou em material extrabiblico alguma informação adicional especifica relevante para a passagem problemática? Muitas vezes, uma aparente dificuldade na escritura é esclarecida quando se leva em conta todos os fatos bíblicos. Um exemplo disso é a morte violenta de Uzá. À primeira vista parece que ele estendeu a mão inconscientemente para impedir a arca de cair (2Sm 6:3-7), mas fica mais claro quando se percebe que a arca havia permanecido cerca de 20 anos na própria casa dele, aos cuidados de seu pai (ISm 7:1,2; 2Sm 6:3). Ao que parece, durante esse tempo Uzá perdera o senso de que a arca era um artefato sagrado. Esse desrespeito pelo sagrado também se revela na violação das divinas ordens e especificações acerca do transporte da arca (Nm 4:15; 7:9). Por toda a Escritura, Deus leva a sério o pecado da irreverencia (2Rs 2:23,24; Lv 10:1-3), porque o respeito a Deus é vital para o relacionamento entre a divindade e a humanidade.
c.                       Deus age como um “cirurgião divino” cortando a parte infectada para salvar todo o corpo? Deus fornece este princípio especifico como razão para a pena de morte contra filhos inteiramente entregues a rebeldia (Dt 21:21) explica também o extermínio em massa dos Amorreus e individual como o de acã (Js7). O castigo infligido a um ou alguns levavam outros ao arrependimento e a respeitar a Deus além de evitar a necessidade de punir muitos.
d.                      Compreender o pensamento hebraico resolve a dificuldade de interpretação? Os escritores do AT não aceitavam e muitas vezes agiram explicitamente contra a teologia mitológica e politeísta dos povos dos seus arredores. Da mesma forma os escritores do NT mesmo utilizando o grego não se desviavam do pensamento hebraico e não absorveram pensamentos da cultura grega como o gnosticismo. Da mesma forma o interprete não deve acrescentar, a forma hebraica de pensar das escrituras, os pensamentos modernos, grego ou do antigo Oriente Próximo. O pensamento hebraico, por exemplo, não costuma fazer diferença entre causa e atuação, desta forma normalmente atribuem a Deus eventos que ele não evitou. Podemos perceber isso na passagem em que diz que Deus endureceu o coração do Faraó (Êx 9:12), quando este texto deve ser interpretado a luz da passagem do mesmo contexto que diz que “o faraó endureceu o próprio coração” (Ex 8:15,32; 9:34). Isto é, Deus iniciou as circunstâncias (apelos e pragas) que levaram faraó a tomar uma decisão (endurecer o coração). Não há nenhum conflito no pensamento hebraico ao afirmar que Deus causa aquilo que, em Sua soberania, Ele permite.
e.                       Qual é o ideal divino na situação descrita? Este princípio ajuda a explicar a permissão divina para o divórcio na lei mosaica. Jesus chamou a atenção para o fato de que Deus permitiu o divórcio por causa da dureza de coração dos israelitas, “entretanto, não foi assim desde o Princípio” (Mt 19:8; Gn 2:24)
f.                                   A atividade divina é um artificio para chamar a atenção, para despertar seu povo para que lhe dê ouvidos? Às vezes, Deus teve que adotar o que pareciam ser medidas extremas, para despertar Seu povo da letargia e dos pecados em que estavam mergulhados. Dentre essas medidas se acham os atos simbólicos representados por Ezequiel, nos últimos dias que antecederam o cativeiro babilônico (Ez 4;5), bem como a ordem divina de Oseias se casar com uma “mulher de Prostituições”, nos últimos dias de graça do reino do norte (Os 1:2).
g.                      Existem ainda pontos não completamente explicáveis ou compreensíveis? Nem sempre será possível nesta vida entender por que Deus fez certas coisas do jeito que fez. Algumas questões como o sofrimento dos inocentes e a morte de crianças só serão explicadas quando o próprio Cristo nos explicar após a sua segunda vinda. Apesar disso, a Escritura fornece evidências e respostas suficientes para que o estudante da Bíblia possa entoar o cântico de Moises e do cordeiro: Justo e verdadeiro são os Teus caminhos, ó Rei das nações! (Ap 15:3)

 

3 As Escrituras Apontam Para Além De Si Mesma

 

Examinaremos agora aquelas partes da Escritura que apontam intrinsecamente para um cumprimento além dela mesma, como profecia e tipologia, ou para significado expandido além dela mesma, como simbolismo e parábolas.

a.                      Profecia. As diversas observações gerais provenientes do testemunho que a Bíblia dá de si mesma são fundamentais para o material profético. Primeiramente, a Bíblia afirma que somente Deus é capaz de predizer o futuro, tanto o próximo como o distante (Is 46:10; Dn 2:45). Segundo lugar, a profecia preditiva não foi dada meramente para satisfazer a curiosidade sobre acontecimentos futuros, mas tendo em vista a objetivos morais, como a confirmação da fé (Jo 14:29) e a promoção da santidade pessoal na preparação para a vinda de Cristo (Mt 24:44; Ap 22:7,10,11). Terceiro lugar, os padrões interpretativos da profecia preditiva devem ser encontrados dentro da própria escritura. Quarto lugar, compreender a estrutura literária de um livro profético fornece proveitoso apoio comprobatório para a interpretação. Quinto lugar, deve-se exercer bastante cautela com profecias ainda não cumpridas. O conselho de Jesus com referência a um proposito moral básico em toda a profecia é pertinente: ela é dada para que, quando acontecer, nós creiamos (Jo 14:29). Antes de acontecer não é possível compreender todos os detalhes das predições, por mais claro que seja o contorno básico dos acontecimentos e das questões.
b.                      Tipologia. Podemos definir tipologia como o estudo de pessoas, acontecimentos ou instituições na história da salvação escolhidos especificamente por Deus para prefigurar de forma preditiva o cumprimento escatológico e antitípico dele mesmo em Cristo e nas realidades evangélicas originadas em Cristo.
As cinco características da tipologia são:
(1)                   A tipologia tem suas raízes na história. Não se perder de vista o caráter histórico real dos acontecimentos, pessoas e instituições. A tipologia está em contraste com a alegoria, que aponta para um significado que denigre e até mesmo rejeita o evidente senso histórico.
(2)                   Um tipo prefigura ou representa o que está por vir. O tipo está em contraste com o símbolo, que é em si mesmo uma representação atemporal da verdade. 
(3)                   Um tipo prefigura, mas não de forma explicita ou verbal. O tipo está em contraste com a preditiva.
(4)                   A tipologia envolve uma correspondência superior. O antítipo é maior do que o tipo. Jesus anunciou que Ele próprio era “maior do que” o templo, que o profeta Jonas e o rei Salomão ( Mt 12:6,41,42).
(5)                   Um tipo é divinamente ordenado para funcionar como uma prefiguração do antítipo. Os escritores do NT reservaram a palavra “tipo” para as realidades históricas escolhidas por Deus para prenunciar um cumprimento antitípico.
Ao explorar o cumprimento tipológico de pessoas, acontecimentos e instituições do AT, os escritores do NT não atribuem ao AT significados que lá não estão. Ao contrário, permanecem fiéis às escrituras do AT, que, de antemão indicam quais pessoas, acontecimento e instituições Deus escolheu para servir como tipos. A única coisa que os escritores do NT fazem é anunciar o cumprimento antitípico daquilo que já foi expresso pelos profetas do AT. João anuncia que Jesus é o Moises antitípico, baseando-se em Deuteronômio 18:15-19, segundo o que, O Messias seria um novo Moisés (Jo 1:21; 6:14)
c.                       Simbolismo. Um simbolismo é a representação atemporal da verdade. É assim que um cordeiro simboliza inocência, e um chifre, força. Mas os símbolos bíblicos se transformam muitas vezes nos blocos de construção da profecia e da tipologia. Cristo, o Cordeiro de Deus (Jo 1:29), e os quatros chifres e o chifre pequeno de Daniel representam poderes políticos ou políticos religiosos específicos.
Ao interpretar os símbolos da escritura, é possível extrair os princípios básicos da própria maneira como a escritura emprega o simbolismo.
d.                      Parábolas. Pelo menos um terço dos ensinamentos de Jesus, conforme registrados nos evangelhos, foram ministrados sobre a forma de parábolas (aproximadamente 40 parábolas diferentes). Também encontramos parábolas no AT, contada por Natan (2Sm 12:1-4) e contada por Isaias (Is 5:1-7).
O gênero parábola apresenta diferentes formas: Provérbios ( Lc 4:23), metáforas (Mt 15:13), ditos figurativos (Lc 5:36-38), comparações (Mc 4:30-32), história (Mt 25:1-13) e alegóricas (Mc 4:1-9). Todas as formas utilizadas por Jesus encerram um elemento comum: Ele extrai das experiências diárias comparações com as verdades de seu reino.
A parábola se difere da alegoria, já que nesta o interprete posterior extrai do texto um nível de significado mais profundo, nunca pretendido nem indicado pelo escritor original.

2 Aplicação Contemporânea


Escritura como transcultural e transtemporal  


Os escritores bíblicos insistem em que a mensagem teologica da Escritura não se acha aprisionada na cultura, nem se aplica somente a determinadas pessoas e a determinado tempo. Ao contrário, é permanente e universalmente aplicável. O próprio pedro utilizou texto de Isaías (40:6-8; I Pe 1:23-25) para falar sobre a palavra de Deus.
Grande parte da instrução ética contida nos evangelhos e epistolas do NT pode ser vista como aplicação prática de passagens do AT. O sermão do monte proferido por Jesus, é aplicação dos princípios do Decálogo; a carta de Tiago, uma aplicação dos princípios de Levítico 19; a carta de Pedro, uma instrução ética construída sobre o versículo “sede santos porque Eu sou santo” (I Pe 1:16, Lv 11:44,45; 19:2; 20:7).

Controles escriturísticos para determinar permanência


O princípio geral articulado e ilustrado pelos escritores do NT, em sua aplicação da Escritura, é aceitar a relevância transcultural e transtemporal da instrução bíblica, a menos que a própria escritura forneça critérios que limitem essa relevância. Exemplo disso são as leis sacrificais/cerimonias que encontraram seu fim em ocasião do seu cumprimento na cruz sendo anunciado a sua vigência no AT (Ex 25:9, 40; Hb 8:5; Sl 40:6-8 Hb 10:1-10; e Dn 9:27)

Personalizando a Escritura


O objetivo final de quem interpreta a Escritura é fazer a aplicação prática de cada passagem à vida individual. Cristo e os apóstolos reforçaram repetidas vezes a mensagem do evangelho contida nas Escrituras, a fim de levar seus ouvintes e leitores à salvação e a relação pessoal mais intima com Deus.
É essencial que o interprete faça a passagem as seguintes perguntas: Que mensagem e objetivo da passagem Deus quer que eu aplique a mim mesmo? Como esta passagem afeta a minha vida espiritual? Que pecado ou fracasso mostra para eu evitar? Quais princípios eternos se aplicam a mim atualmente?
Devemos, em última análise, ler e aceitar a Escritura como se fossemos participantes nos poderosos atos salvíficos de Deus, como se as mensagens divinas fossem pessoalmente a nós dirigidas – a viva e ativa Palavra de Deus falando à nossa alma.

Bibliografia


Tratado de Teologia Adventista

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